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Ações integradas que visam contribuir para identificação, fortalecimento e divulgação de grupos e instituições que trabalham com arte e cultura, envolvendo jovens brasileiros,
com foco na transformação social.

Luz no palco e brilho nos bastidores

16 de Junho de 2008

 

Espetáculos evidenciam a potência da arte unida à juventude.

Por três dias o Teatro Carlos Gomes, no Centro do Rio de Janeiro, foi vitrine para espetáculos que jovens brasileiros há tempos vêm compondo nos bastidores: música, dança, circo e voz impulsionam transformações sociais pelo país. Mais de 300 artistas se cruzaram sob a batuta da 2ª Mostra Brasil Juventude Transformando com Arte. Na noite de 2 de junho, o grupo Atitude Feminina, trio de hip hop brasiliense engajado na luta contra a violência sofrida pelas mulheres, abriu as apresentações. "Abrir o espetáculo foi uma experiência nova e maravilhosa", resumiu Helen Silva, ciceroneada pelo rapper Marcello Silva, que conduziu a noite ao lado do maestro Silvio Barbato, um dos curadores da 2ª Mostra Brasil. Na coxia, o músico Hermes Barcelos, mal podia conter a emoção. O novo trompetista do PIM - Programa Integração pela Música, de Vassouras (RJ), subiu ao palco com a orquestra pela primeira vez. Em cena, mesclaram a música clássica com a percussão do Bagunçaço, da Bahia. "É gostoso lidar com tantas novidades. Para mim é uma estréia dupla: no PIM e na mistura do erudito com o popular", disse. Enquanto Hermes estreava, o harpista Pablo Deboleto, vindo de Dourados (MS), se preparava para entrar. Nervoso, o músico não via a hora de pisar no palco para uma apresentação inédita com o reconhecido violeiro Roberto Corrêa, um mineiro que mora em Brasília. A dupla se conheceu no Rio e ensaiou horas antes, no mesmo dia. Como resultado deste encontro, aplausos calorosos do público, que seguia degustando as novidades. Uma delas, a voz emocionante de Graziele Valvano Assunção, cantora da orquestra PIM, que acabou transformando pessoas que nunca tinham se visto em companheiros afinados no palco.

Se acabasse ali, o show já teria encantado a platéia, que viajou ouvindo canções como Trenzinho Caipira, de Villa Lobos. Mas nos camarins ainda havia muita gente pronta para tocar, como os meninos do Afro Samba, um dos grupos que participa do AfroReggae. Depois dos primeiros acordes, o público já estava de pé, dançando o batuque. Aquecida, a platéia ainda vibrou com o time do Bagunçaço. Satisfeito com o resultado, o maestro Silvio Barbato, contou o segredo de tanta harmonia. "A cabeça de todos estava focada na integração. Depois de balancear todas as nuances e de horas de ensaios, o espetáculo estava pronto". Marcello Silva, emocionado, encerrou a noite com aplausos e público agradecido.

 Noite de dança - Se a missão de Silvio Barbato estava concluída, a de Maria Eugênia Milet, curadora da segunda noite, estava apenas começando. Na dia seguinte, minutos antes de abrir as cortinas, a coordenadora geral do CRIA, de Salvador, fez uma roda grande e de mãos dadas com os artistas deu voz aos participantes. Tia Maria, figura importante das tradições fluminenses do Jongo da Serrinha (RJ), puxou as orações e agradecimentos. Quem abriu a festa foi a Associação OCA, com seu balé de cordas, recriando a brincadeira infantil. Para Paulo Gonçalves, o Paulo Blec, foi importante ver o grupo de Carapicuíba (SP) integrado com tantos outros de lugares distantes do Brasil. "Dos meus 21 anos, 12 foram dentro da OCA. Minha vida se baseia neste projeto. Hoje, faço faculdade de música e dou aulas para os mais jovens. Nada tão bacana quanto a certeza de que podemos todos juntos formar uma coisa só", comemorava. Assim como ele, Fernanda Raíssa, de 14 anos, há sete no Majê Molê, também não saberia viver sem o balé. Apesar de acostumada às apresentações a bailarina estava nervosa. Foi naquela noite que as meninas de Pernambuco estrearam a coreografia “Mistura de Cultura”, aplaudida de pé pelo público. À vibração do

“Este é um grande show. É um momento raro e delicioso, só posso dizer que temos grande prazer de participar desta apresentação”  José Marciel, Cia Balé de Rua

Majê Mole se seguiu o espetáculo da Cia. Balé de Rua, de Uberlândia (MG). Recém chegados de Paris e já de malas prontas para mais dois meses de turnê na Europa, o grupo se aquecia no camarim pisar o palco da 2ª Mostra Brasil. "Este é um grande show, um grande dia. Estamos ensaiando há um mês para este espetáculo. É um momento raro e delicioso, só posso dizer que temos grande prazer de participar desta apresentação", definiu o bailarino José Marciel. Na mesma noite, houve espaço também para a capoeira angola, representada pela Academia Mestre João Pequeno de Pastinha, da Bahia. "É uma demonstração da nossa capoeira, cheia de ladainha, manhosa", explicou Nildes Sena. Para completar o cenário brasileiro, o grupo de teatro Spectaculu (RJ), os quilombolas do Fado de Quissamã (RJ) e o Samba de Lata (BA) emolduraram o palco.

Mistura - Se as duas primeiras noites foram representantes da diversidade brasileira, a terceira e última noite da 2ª Mostra Brasil, em 4 de junho, extravasou essa integração, sob a curadoria da autora e diretora teatral Karen Acioly. O ator Sávio Moll foi o condutor da noite, que mesclou teatro, circo, dança e coros. "É uma honra estar aqui. O espetáculo é de vocês, sou apenas um instrumento para que vocês brilhem, sou a ponte", declarou Sávio, encarregado de costurar o espetáculo com textos sobre o tempo, e que, emocionado, aplaudia nos bastidores. O brilho mencionado pelo apresentador foi multiplicado por inúmeros grupos que lotavam a coxia num entra-e-sai de palco cúmplice e vibrante. Cada grupo que entrava reverenciava o próximo, demonstrando respeito e orgulho por dividir o mesmo espaço e o mesmo ideal. Uma das estrelas da noite, os índios da Aldeia Guarani de Itarypu (RJ) atiçaram a curiosidade dos outros artistas. "Este encontro com os indígenas me emocionou", confessou Daniel Rocha, do Conexão Felipe Camarão (RN).

Dividindo o palco, o Coral das Escolas Municipais de Juiz de Fora (MG), os músicos Leandro Castilho, Reginaldo e Reinaldo Vargas davam o tom para artistas circenses, capoeiristas, índios e o Fado de Quissamã se apresentarem. O professor da Escola Nacional de Circo Leon Schlosser, equilibrista de 74 anos, mostrou que o tempo da arte não tem idade. Ao lado do parceiro Edson Silva, o artista emocionou a platéia, que aplaudiu de pé, e contou com a presença do vice-governador do Rio de Janeiro, Luiz Fernando Pezão. Em meio aos números circenses, houve espaço também para as meninas do Projeto Encantar, da Cia. Étnica (RJ). A diretora, Carmen Luz, criou um espetáculo novo, especialmente pensado para a Mostra Brasil, a partir de uma música composta para a ocasião pelo compositor Alexandre Elias, também diretor musical desta noite. Entusiasmadas com tantas novidades nos camarins, as bailarinas mirins se divertiam com a diversidade. "Na hora de entrar no palco o nervosismo vai embora", garantiu Luthyelen Batista, de 12 anos, há cinco dançando.

Cenas do espetáculo “Vida de Artista – a arte de construir um espetáculo”, do programa social Crescer e Viver (RJ), preparavam o fim das apresentações e da 2ª Mostra Brasil, que contou com a experiência de Carlos Cavalcanti, curador dos grupos de circo. Com o número da pirâmide, tecido e acrobacias ousadas, os artistas revelaram que é possível harmonia e equilíbrio num espaço que juntou identidades, culturas, folclores, idades e estilos. E que, mais do que isso, essa mistura é tão forte que emociona, a ponto de tocar a platéia e mexer dentro de cada um. A dança do Balé de Rua coroou essa força e todos cantaram ao som de Oração ao Tempo, de Caetano Veloso. Nem as cortinas fechadas convenciam os participantes de que era hora de partir. Na coxia, a festa continuava: instrumentos recolhidos e contatos trocados, a música continuou rua afora, mostrando seu brilho – e sua potência nos bastidores.



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